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terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Cerca de pedra II

A liberdade dos povos antepassados estava além dos limites das cercas de pedras. Na dura caminhada os cidadãos deixaram os rincões e foram ao encontro da modernidade. Despovoaram as casas de taipa no centro dos cercados de blocos de pedras empilhadas um sobre o outro e desceram do “pé de serra” pelas veredas até chegar ao asfalto da civilização. Trocaram a vida pacata do roçado em que moravam em casas de pau a pique cercadas por grandes extensões de cercas monumentais para viverem na cidade preso em casebres cercados por cercas elétricas e vigiado vinte e quatro horas pelos olhos das câmeras de segurança espalhadas por todas as esquinas. O homem e a mulher do tempo presente vivem encarcerados por grandes estruturas de ferro e cimento e ao entorno de todos os pormenores que o progresso a impõe. A emancipação da vivência rústica veio de encontro à falta de segurança vivida pelas pessoas de bem, e diante do novo quadro, moram enchiqueiradas pelas muralharas antissocial.

O homem quase que por completo abandonou a engenharia das construções das cercas de pedras e passou a rodear os quintais com arame farpado, estacas de madeiras e ou de concreto. As cercas de outrora ficaram obsoletas no arrastar das centenas de anos e entra para a história (pelo menos na escrita deste que vos escreve), como patrimônio histórico, sociocultural e econômica do povo brasileiro. Os blocos de pedras colocados um sobre o outro formando uma parede, no momento em pulsação contam a história da ocupação do homem no limiar do território em uma época primitiva. Construídas compulsoriamente com o suor e lágrimas, as esculturas monumentais, é um testemunho vivo do desbravamento dos moradores do torrão e expressa a história dos ancestrais fundadores de fazendas, freguesias e cidades. Cada pedra ali colocada uma a uma, alinhadas é um registro permanente do legado deixado pelos ascendentes. As cercas são uma verdadeira obra de arte. Monumentos da Nação. 

A moradia interiorana em que viva os cidadãos entre os cercados de pedras aos poucos foram sendo desabitadas em prol das arquiteturas modernas do “mundo civilizado”. As engenhosas esculturas rudimentares com o tempo foram sendo surrupiadas para serem utilizadas como matéria prima nas construções civis. A emigração tornou-se um fato e as periferias dos centros urbanos passaram a ser uma problemática pela falta de estrutura para abrigar os retirantes. Com a modernização e evolução da civilização, a literatura encarregou-se em transformar o semear dos ditos das cercas de pedras em um emaranhado de palavras, com o sentido de alcançar, um tanto quanto, a mesma durabilidade das pedras fincadas nas cercas e levar a se arrastarem na eternidade. Só as letras enfileiradas em registro, como as pedras nas cercas, poderão alcançar tamanha façanha. 



 (*) JOSSELMO BATISTA NERES
E-mail: josselmo@hotmail.com

Crônica publicada no Jornal Diário do Povo do Piauí em 20/01/2015 na página 02 - Opinião (Jornal Impresso).

Pode também ser conferido na íntegra na Edição Eletrônica no endereço abaixo:

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