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segunda-feira, 29 de setembro de 2014

O valor do dinheiro

Para que serve o imposto que pagamos? Eu não tinha parado para observar com maiores detalhes o cupom fiscal das compras no supermercado. Essa semana quando cheguei em casa bateu-me a curiosidade de ver a forma da descrição das mercadorias no comprovante fiscal. E olha que a compra foi minúscula. Eu já tinha visto que cada produto discriminado informa o percentual de imposto pago por cada produto, uns são 12% (doze por cento), outros 17% (dezessete por cento), outros 25% (vinte e cinco por cento) e por ai vai, o que eu ainda não tinha notado era a informação com a descrição no finalzinho da nota fiscal: “valor aproximado dos tributos”. Fiz uma compra com nove produtos os quais uns era taxado em 12% e outros em 17%. Paguei pelo valor da compra R$ 46,27 (quarenta e seis reais e vinte e sete centavos). O valor aproximando dos tributos constando no cupom das compras foi de R$ 17,37 (dezessete reais e trinta e sete centavos), o que quer dizer que 37,54% foi o percentual de imposto repassado ao governo. Agora só mim resta aguardar o seu retorno na forma de benfeitorias.
Como fiscalizar a aplicação dos impostos arrecadados? O trabalhador brasileiro trabalha 151 dias só para pagar imposto, cinco meses por ano, que corresponde que, em média 41,4% dos seus vencimentos brutos vão para o governo. Nessa percentagem esta inclusa todos os tributos cobrados pelas autoridades governamentais. Os índices são com base em 2014, no entanto, pode variar de um ano para o outro, que pela base histórica a cada ciclo a carga tributária só faz é aumentar nas “costas” do brasileiro. O Brasil é um dos países que paga mais imposto no mundo e a diferença entre os países com índices maiores é que, eles oferecem serviços públicos dignos e eficientes à população. Os governos arrecadam impostos dos cidadãos desde os primórdios da civilização, que por sua vez, a cobrança sempre foi reclamada. O “imposto”, como o próprio nome já diz, é algo que somos obrigados pelo governo a aceitar e pagar. Não há escapatória.
Para onde vai o imposto que pagamos? O pagamento de tributos é legitimo e necessário para manter o funcionamento da estrutura governamental, como educação, saúde, segurança, estradas, entre outros serviços com qualidade. Agora a forma como a carga tributária é imposta é um desrespeito ao trabalhador, que precisa ser reavaliada, assim como, o rigor do retorno das cifras com serviços públicos eficientes. A reforma tributária precisa sair do papel, entretanto, entra ano sai ano, e não sai da gaveta a tão sonhada reestruturação. Uma vez por outra o governo lança algumas medidas pontuais com redução de alguns impostos, mas na reorganização nada tem feito para diminuir os vultosos tributos que tanto massacra o cidadão.
Qual a garantia que o imposto vai retornar em forma de benfeitorias? No discurso, os valores dos tributos são para ser revestido em benefícios comuns a todos. Não é o que funciona na prática. As camadas mais baixas são as mais penalizadas com a forma da cobrança de imposto, já que, o percentual de consumir do valor do labor do mês é maior (pra não dizer todo o valor disponível), já às classes mais ricas o percentual de consumo da renda é menor, já que, como essa camada tem um pro labore maior, consequentemente tem uma predisposição a mais para poupar. Vendo pelo ângulo das comparações, o pobre não tem vez e o rico tende a aumenta cada vez mais a concentração de renda. Enquanto não houver uma reforma tributária efetiva, o Brasil vai ser um país de poucos. Deu pra entender? Também não.

(*) JOSSELMO BATISTA NERES
E-mail: josselmo@hotmail.com

Crônica publicada no Jornal Diário do Povo do Piauí em 27/09/2014 na página 02 - Opinião (Jornal Impresso).
Pode também ser conferido na íntegra na Edição Eletrônica no endereço abaixo:
http://www.diariodopovo-pi.com.br/Jornal/Default.aspx

sábado, 20 de setembro de 2014

O patriarca do clã

             Cansado da labuta nas terras da localidade Cercado, município de Picos, hoje Sussuapara, as quais o solo estava enfraquecido para a lavoura, Luiz Leal de Moura Santos, o Luiz Cândido, em julho de 1960 viajou para o Vale do Fidalgo para comprar uma propriedade no lugar Canto da Volta, município de São José do Peixe, hoje São Miguel do Fidalgo. Negócio fechado e data estipulada para a mudança. Minha avó Joaquina retrucou, não queria sair de perto dos familiares e amigos para ir se aventurar ao desconhecido, convencida pelo patriarca da família, em setembro do mês ano colocaram os “cacos” em um pau de arara e seguiram rompendo o horizonte escrevendo um novo capítulo da história. Todos os oito filhos do casal já eram nascidos, a mais velha com quatorze anos e a mais nova com oito meses de idade.
            Era um dia de domingo, meus avós maternos e os oito filhos abandonaram o conforto da casa no Cercado para desbravar uma terra distante onde não existia nenhum parente nem aderente. Na minha visita imaginária ao passado vejo que, quando os novos moradores chegaram à localidade, olharam o cenário em volta e sentiram-se uma imensa saudade, as lembranças da vida que ficara para trás veio à tona. Os corações pulsaram acelerados. Recuperados do impacto. O olhar do meu avô era de felicidade. O semblante da minha avó estava entre uma alegria eufórica e o medo de enfrentar os desafios da nova vida. A mudança causa estranheza a todos nós, principalmente quando temos uma rotina definida e seguimos outra trilha a qual não estamos acostumados.
             Com um amor imensurável ao trato da terra, Luiz Cândido cultivava “diumtudo”. No Cercado, tinha um quintal com plantio de coco, banana, manga... Quando decidiu fazer a mudança para o lugar Canto da Volta, vendeu a sua terra e casas que possui na cidade de Picos e seguiu o caminho construindo a nova história. Chegando ao seu destino não viu uma árvore frutífera na redondeza, perguntou a um morador da vizinhança por que na região não se plantava pés de coco, maga, banana, laranjas, tangerinas, goiabas... Teve como resposta: “é por que aqui nas terras não dá”. Mandou cavar um poço tubular na propriedade e por sorte acertou bem na veia do lençol freático. Ficou jorrando diuturno e para aproveitar a água que derramava, semeou uma variedade de frutos e todos vingaram com qualidade, ai estava o porquê das terras não produzir as frutas, ninguém plantava.
            Meu avô era alto, magro, austero. Também tinha o momento espirituoso. Fazia brincadeiras e contava causos da época da sua juventude na região de Picos. Eu ficava admirando com as conversas. Em uma das falas disse que – não fumou e não era de tomar bebida alcoólica, mas uma vez por outra nas festas tomava uma talagada de vinho. As moças se derretiam aos seus encantos. Não perdia um forró pé de serra nas imediações. Era um verdadeiro pé de valsa. Mesmo depois que matrimoniou não deixou de frequentar os forrós, até que um dia uma “figura” o abandonou no meio do salão ao observar a aliança no dedo. Certamente a moça com segundas intenções notou que ele era casado. Por capricho disse que daquele dia em diante não dançou mais nenhuma festa. Fiel às raízes, quando passou a morar no Fidalgo, todos os anos voltava a Picos para visitar os amigos e familiares.

            (*) JOSSELMO BATISTA NERES
E-mail: josselmo@hotmail.com
 

 Crônica publicada no Jornal Diário do Povo do Piauí em 20/09/2014 na página 02 - Opinião (Jornal Impresso).
Pode também ser conferido na íntegra na Edição Eletrônica no endereço abaixo:
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sábado, 6 de setembro de 2014

As cores do sertão

 A paisagem do sertão na maior parte do ano carrega as cores dramáticas da aridez. Em uma vasta parte das regiões brasileira na época da estiagem, as árvores são cinzentas, retorcida e com poucas folhas nos galhos. Alguns autores de diversas épocas se atreveram a narrar por diversos gêneros literários à tragédia da seca no Brasil, e o fizeram muito bem. Não que o tema alusivo servisse de inspiração para o criador pegar a pena e começar a desenhar os seus escritos, mas a sede de retratar o incômodo inerente, mesmo que a manifestação da real situação do torrão fosse ao molde da estrutura de obra de ficção. O material literário mesmo tendo títulos bastante antigos, o tema é atual, e a intenção dos ensaístas era, e ainda é, chamar a atenção do governo que faz vistas grossas à problemática pertinente, e nas entrelinhas, proclamar a elaboração de um plano de ação que deve ser feito ao longo prazo para amenizar os efeitos devastadores da falta prolongada da chuva e impor alternativas para atenuar os efeitos catástrofes.
As obras literárias “Ataliba, O vaqueiro”, do piauiense Francisco Gil Castelo Branco, tida pelos críticos literários como o primeiro autor a levantar a bandeira ao expor a problemática da seca no nordeste brasileiro; “A Bagaceira”, de José Américo de Almeida; “Luzia Homem”, de Domingos Oliveira; “Aves de Arribação”, de Antonio Sales; “O Quinze”, de Rachel de Queiroz; “Vidas Secas”, de Graciliano Ramos; “Grande Sertão: Veredas”, de Guimarães Rosa; “Os Sertões”, de Euclides da Cunha; “Sertão”, de Coelho Neto, dentre outros, descrevem enfaticamente as cores dramáticas do interior do país, assim como, as questões sociais significativas e as calamidades que assola as regiões de extrema sequidão, tão presente no cenário de convívio do sertanejo.
A temática da seca nos romances literárias, não é usada apenas como pano de fundo para encenar as histórias, mas para recontar as reais situações da vida do camponês, e mesmo os relatos estejam nas páginas de obras de ficção, existe uma preocupação dos escritores de reproduzir a imagem da sociedade com as cores peculiar da região concernente. As passagens da ambientação, os relatados da falta de chuva, da aridez do solo, a fome, as mortes, o abandono da terra pelo proprietário pela falta de perspectiva, o sofrimentos dos imigrantes, todas essas questões é um tema bem real para muitas pessoas que vivem no sertão, pois interferi literalmente no ciclo de suas vidas. O leitor pode até imaginar que o cenário das regiões brasileiras realçado pelos efeitos do verão é representado por seca e miséria. Não que também não seja, mas existe o outro lado da moeda, no entanto, em um dos lados ano após ano o estio vem castigando o sertão.
A seca em algumas regiões contada nos títulos de inúmeros impressos, além de nos possibilitar conhecer uma parte da historiografia do nosso povo, são documentos riquíssimos em detalhes. A consequência da estiagem é triste, mas as obras mostram o alto valor da literatura, a mistura de ideais dos personagens... E no jogo poético dos termos, buscam sensibilizar as autoridades no que tange a elaboração de projetos eficazes em combate à seca. Essa é a forma de vida do sertanejo fotografada nas próprias cores.

            (*) JOSSELMO BATISTA NERES
E-mail: josselmo@hotmail.com


 Crônica publicada no Jornal Diário do Povo do Piauí em 05/09/2014 na página 02 - Opinião (Jornal Impresso).

Pode também ser conferido na íntegra na Edição Eletrônica no endereço abaixo:
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O progresso bate à porta


            A vida bucólica de antes no campo só existe na memória. A vivência no interior desde pequeno, cercado pelo esplendor da vegetação e o modo original do homem da roça, fez-me lembrar a vida simples e arrojada com toda a opulência da significância dos tempos de outrora. No reduto da liberdade o sertanejo vive diuturno com os afazeres da labuta diária. Quando a noite chega à lamparina esta posta abastecida com o querosene e no ponto de acender o pavio para alumiar a casa noite adentro, até que todos se recolhem aos seus “ninhos” e durma tranquilamente. Uma vez por outra à lamparina fica acessa até o moleque que tem medo do escuro dormir. A noite segue silenciosa. Na madrugada o galo canta avisando que o dia vem raiando. O gado mungi no curral. As ovelhas berram no chiqueiro... Os pássaros cantarolam. Todos em alegria resplandecente pelo novo dia.
            A vida no campo pode ser difícil para alguns, no entanto, esta aliada ao ponto de vista e a maneira como vive o ser humano no torrão. Um tanto quanto, pode-se comparar a uns outros cidadãos que moram na cidade. Na zona rural cria-se a galinha, o porco, a ovelha, o bode, o boi... O plantio é suficiente para o sustento, e uma vez por outra sobra uma saca de grãos para vender, o que certamente é trocado na bodega pelo o que não é produzido na roça. A lenha que serve como combustão para cozinha os alimentos busca-se na chapada. Água para encher os potes da casa que vai servir para beber, cozinhar os alimentos, lavar a louça... Busca-se no poço em latas ou em cabaças trazidos nos ombros (na cabeça), ou no lombo de jumento. As brincadeiras das crianças interioranas é montar em talo de carnaúba e sair a galope dizendo que é um cavalo; fazer um cercado com uns tornos enfiados ao chão e coloca chifres de boi dentro e dizer que é gado (os chifres de boi menor era os bezerros); pega um pedaço de tábua, lada de óleo vazia, prego e chinelo no munturo e fabrica um automóvel... Esse é o retrato da vida simples e feliz no ambiente aos moldes originais.
            No interior tudo o que precisa (ou quase tudo) para a sobrevivência está em volta. A natureza permite ao camponês criar, plantar, cuidar e preserva o ambiente em que vive para em troca dar-lhes o meio da sobrevivência. Passado o tempo o progresso ronda os terreiros e o homem inconformado com a carência do poder público, entre outras a falta de estruturas para dar uma boa educação e certamente um futuro melhor para os filhos, resolve procurar a modernidade dos centros urbanos. O processo migratório ocorre naturalmente do campo para a cidade sem que esta tivesse estrutura para abrigar tamanho êxodo. O resultado é o aglomerado de casebre nas periferias das cidades, raras exceções.
            Os roncos dos motores e a agitação frenética da zona urbana trouxe a tona o choque de realidade. As zonas rurais perderam a identidade para dar lugar o advento do progresso. A lamparina deu lugar à energia elétrica com todas as parafernálias da tecnologia. A água que era colocada em potes na bilheira, agora esta em geladeira. A água carregada a distância para abastecer a residência, agora é só abrir a torneira... Os céticos e irredutíveis com as mudanças tiveram que se adaptar com a nova realidade. Saudades do meu interior.
       
            (*) JOSSELMO BATISTA NERES
E-mail: josselmo@hotmail.com


Crônica publicada no Jornal Diário do Povo do Piauí em 25/08/2014 na página 02 - Opinião (Jornal Impresso).
Pode também ser conferido na íntegra na Edição Eletrônica no endereço abaixo: