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segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Cenas do sertão

            A seca estarrecedora no nordeste brasileiro faz com que os governos ano após ano criem medidas emergências (e eleitoreiras), como é o caso da farra dos carros-pipa, ao invés de compor soluções definitivas com investimentos em infraestrutura nas regiões em estado de calamidade e implantar um sistema de desenvolvimento sustentável para que as pessoas não necessitem tanto de ações assistencialistas, e dessa forma, sanar ou pelo menos amenizar um dentre tantos problemas causados ao sertanejo pela carência de chuva no sertão. Construções de cisternas, açudes e barragens são algumas das ações utilizadas pelos governantes para diminuir o impacto da estiagem, e a pergunta é, e se as chuvas na região não forem suficientes para encher os reservatórios, como o ser vivo sobreviverá? E por falar em chuva, a crise hídrica passa a ser um assunto recorrente nos noticiários nacionais pelos poucos milímetros pluviômetro no sudeste do país, com destaque especial para o Estado de São Paulo, que vive uma das maiores secas da história. A falta de chuva leva a represa do Sistema Cantareira (reservatório que é o principal fornecedor de água a população da capital paulista e regiões metropolitanas), aos menores índices em termos percentuais da reserva já vistos. A crise ocasionada aos cidadãos pelo agravamento da escassez de água chama a atenção dos gestores para o problema. A maior cidade do Brasil está “à beira do colapso”.
O governo nega que, possa vim acontecer um apagão no abastecimento de água na grande São Paulo e regiões que dependem do Cantareira. Contradizendo o chefe, o presidente da Agência Nacional de Água, diz que, a crise hídrica está à beira de um caos. O que impressiona nos informes relacionado à matéria, são as cenas do sertão em plena terra da garoa, que mais parece à paisagem do torrão nordestino. O Sistema Cantareira a cada dia registra quedas consecutivas e bate um recorde histórico de índice negativo nas águas do reservatório. As autoridades estão utilizando bombas flutuantes para captar a água que fica abaixo do nível das comportas, o que chamam de “volume morto”, ou reserva técnica, para transportar aos centros de tratamentos e logo após o consumidor. Uma coisa é certa, se não chover os milímetros no período esperado, o Cantareira entrará em recessão.
Assistindo o panorama das imagens do solo esturricado e rachado na represa em São Paulo, onde ver um cenário de extrema sequidão em toda a volta, bateu na reminiscência psicológica o leito da lagoa de minha infância. Até que a balbúrdia pelo baixo nível da lagoa do Fidalgo poderia estar no mesmo patamar, mais ainda bem que os fidalguenses não necessitam da reserva, assim como, um tanto quanto, os paulistanos necessitam do Sistema Cantareira. No imaginário passa um filme dos tempos invernoso com a lagoa extravasando de tão cheia, ao tempo que, na dura realidade da pestilência, a estiagem corrói a lembrança frutífera.  
Mera comparação do sertão do nordeste com o sertão do sudeste, províncias de um mesmo Brasil diferenciadas por características climáticas e problemas sociais. Comparações opostas. Devida estar localizada em área que ocorre poucas chuvas durante todo o ano, há década o efeito do estio castiga algumas regiões do nordeste, e como já é de praxe, os noticiários já não dão tanta importância ao tema. Setores administrativos diferentes, entretanto, a falta de planejamento e investimento na (re)estruturação dos estados de criticidades, de forma igual, sofrem pela falta de medidas centralizadoras. A salvação é esperar São Pedro abrir as torneiras.

 (*) JOSSELMO BATISTA NERES 
 E-mail: josselmo@hotmail.com

Crônica publicada no Jornal Diário do Povo do Piauí em 27/10/2014 na página 02 - Opinião (Jornal Impresso).
Pode também ser conferido na íntegra na Edição Eletrônica no endereço abaixo:
http://www.diariodopovo-pi.com.br/Jornal/Default.aspx

domingo, 19 de outubro de 2014

Mandacaru

            Mandacaru quando fulora na seca / É o sinal que a chuva chega no sertão... A letra da música “Xote das Meninas”, composta por Luiz Gonzaga e Zé Dantas, e espalhada à melodia na voz do rei do baião, nela o mandacaru foi cantado, encantado e eternizado. Resistente às condições climáticas do semiárido, a árvore como é considerada pelos botânicos por causa do caule lenhoso é o símbolo de relutância da seca, devido a grande capacidade de captação e retenção de água nas hastes carnudas e suculentas. Com o nome científico cereus jamacaru, o mandacaru como é conhecido popularmente, é uma planta da família das cactáceas e pode alcança em média cinco metros de altura a qual possui um formato que lembrar um candelabro. Em períodos de escassez de chuvas, com secas prolongadas, o agricultor de poucos recursos recorre ao arbusto cactáceo nos períodos críticos para alimentar os animais, principalmente o gado bovino.
A árvore também serve para a restauração de solos degradados, ornamentação, escultura viva, propriedades medicinais, princípios ativos e fazer cerca natural por ser uma espécie de vegetal espinhoso, entre outros. Comum no nordeste brasileiro, o mandacaru tem a flor branca, perfume suave e abri as pétalas só depois que o sol se põe e fecha devagar logo ao amanhecer para não mais se abrir, ou seja, cada flor só dura um período noturno. O fruto é comestível. Tem a cor violeta forte, a polpa é branca e com várias sementes minúsculas pretas. Ao meu paladar o fruto tem um sabor insípido (confesso que não é das minhas preferidas), já outras pessoas dizem ser saboroso. Diversas aves da caatinga tão logo ver o fruto maduro, começar a bicar a casca para se alimentar da parte carnuda.
Quando morava no município de São José do Peixe, no lugar Canto da Volta, hoje São Miguel do Fidalgo, o que mais eu gostava da árvore era usar o caule seco como balsa. Não entendeu? Deixa-me explicar. O mandacaru seco por ser bem leve não afunda e na minha meninice junto com outros guris disputávamos uma tora do cereus jamacaru para usar nas brincadeiras quando dos banhos nas águas da lagoa do Fidalgo, e por muitos servia como instrumento de travessia de um lado para o outro do lago, funcionando como se fosse um barco.
O arbusto é muito apreciado pela fauna, principalmente como alimento alternativo para sustentar os rebanhos bovinos lá pelo “fim da seca”, quando a fome está braba e nas roças não se encontra mais pastagem. Por causa da grande quantidade de espinhos espalhados por toda a superfície é preciso queimar o cacto para por fim os ferrões e só depois de sapecado é que corta em pequenos pedaços e coloca na cocheira para os animais saborear a ração. Entretanto, a utilização constante da planta nos sucessivos anos de seca, sem a reposição, pode levar o árvore à extinção e distanciar o criador da cultura. No entanto, o mandacaru, continua como uma referência para o povo em época de estiagem, por sua durabilidade, adaptabilidade e beleza. Continua como símbolo de austeridade e como identidade do cidadão que vive no torrão.

(*) JOSSELMO BATISTA NERES
E-mail: josselmo@hotmail.com

Crônica publicada no Jornal Diário do Povo do Piauí em 19/10/2014 na página 02 - Opinião (Jornal Impresso).
Pode também ser conferido na íntegra na Edição Eletrônica no endereço abaixo:
http://www.diariodopovo-pi.com.br/Jornal/Default.aspx

domingo, 12 de outubro de 2014

Voando no asfalto


            Era sexta-feira, às 16h20min sai de Picos e segui rumo a São Miguel do Fidalgo. Fui para os festejos do padroeiro da cidade. Passei pelas cidades de Oeiras e Colônia do Piauí até chegar ao destino. A duração da viagem foi em média duas horas. À noitinha aterrissei no fidalgo. Permaneci por lá até o domingo. Às 08h00min levantei voo em direção a Simplício Mendes onde fui cumprir o convite para um almoço em louvor ao batizado de dois guris. No trajeto passei por Paes Landim. Às 08h55min estacionei o carro ao lado a Igreja matriz. Cheguei bem na hora. Fui direito para a Igreja assistir a missa e logo depois prestigiar a cerimônia religiosa dos meninos. Terminando o ritual da bênção do Padre, já era quase meio-dia, voei para a propriedade do pai dos moleques, a uns 10 km da sede do município, onde iriam acontecer os comes e bebes. O dia estava com um sol escaldante. Fiquei por lá até às 15h30min do domingo. Hora que peguei a estrada de volta a Cidade Modelo. Não pense besteira, caro leitor, bebida alcoólica não fazia parte do cardápio da festa. A mesa estava farta, churrasco rolava solto, já bebidas só água e refrigerante.   
            Admirador da vida campestre, não perdi tempo quando o fazendeiro chamou algumas pessoas, as quais estavam em uma roda de conversa (eu estava lá) para ir até o cercado. Todos já estavam saciados. O proprietário nos levou até o curral para nos mostrar algumas crias ali presas e por pouco não presenciamos o parto de uma ovelha. Quando chegamos ao redil onde se encontravam encarceradas, uma tinha acabado de parir três borregos. Os filhotes estavam no meio do sol, por sorte tinha acontecido à dádiva há alguns instantes, logo o dono as pressas correu para socorrer os filhotes. Pegou os recém-nascidos e os colocou na sombra bem ao canto do aprisco. Eram três, mas um estava morto. “Este já nasceu morte”, retrucou o criador.
            Chega a hora da despedida. Para retornar a Capital do Centro Sul eu só conhecia a rodovia que volta por Colônia do Piauí, passando por Oeiras. Pedi algumas informações sobre os atalhos e a distância dos trechos que liga Isaías Coelho, Vera Medes, Itainópolis até chegar a Picos. Jamais tinha andado por estas rodovias estaduais e se quer sabia a saída do centro urbano de Simplício Mendes para o inicio da via asfáltica que liga aos municípios. Fui orientado da seguinte forma: “Você pegar esse trecho da 020 (BR 020) quando chegar lá no posto (posto de combustíveis), ao invés de pegar a rua que sai na igreja que vai para Oeiras, você segui direto, ai é só segui, não tem outro asfalto, só lá nos morro tem o asfalto que vai para Campinas (Campinas do Piauí) e chegando no Samambaia já perto de Picos segue a esquerda, a BR a direita vai para Jaicós, Paulistana”. Pronto, o mapa do itinerário já estava fixado na cachola. Outra pessoa que estava ouvido àqueles ensinamentos retrucou: “Eu prefiro andar por Oeiras, o tempo que gasta indo por Isaías Coelho é o mesmo indo por Oeiras, pois por Isaías Coelho tem muita curva e de Itainópolis pra lá tem uns buraquinhos, mas diminui uns 60 km”.  
Com um ar de aventureiro e querendo conhecer o desconhecido, resolvi encarar a rota nunca dantes percorrida. Não me arrependi. Apreciei as paisagens que da vida aquele sertão e ao mesmo tempo desbravei o caminho que nunca tinha trilhado. A viagem foi tranquila. Às 17h30min pousei na Capital do Mel. Passado uma semana da peregrinação, sentado na escrivaninha, os pensamentos ficaram pertinentes aos vocábulos: ‘pra onde fui e por onde voltei’. Logo comecei a escrever esta crônica que você acabara de ler. Se é que não começaste pelo fim.

 (*) JOSSELMO BATISTA NERES
E-mail: josselmo@hotmail.com



Crônica publicada no Jornal Diário do Povo do Piauí em 12/10/2014 na página 02 - Opinião (Jornal Impresso).
Pode também ser conferido na íntegra na Edição Eletrônica no endereço abaixo:
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terça-feira, 7 de outubro de 2014

Engrenagem da existência


Descrever os sentimentos não é uma tarefa fácil. Falo por mim. Cada um tem a maneira de encarar o “mergulho” da existência. Leitor imagine falar do amor preso nos recantos do coração, que só quem sente é que sabe a verdadeira sensação que se passa na engrenagem do peito. Não está à vista, mas tratar-se de uma emoção intrínseca envolvente; saudades sem limites; articulações subjetivas; pensamentos em interação com a realidade... Essência da própria alma. Podemos até tentar, todavia, nada explica as dimensões emocionais que afetam a existência do ser humano. Isso é um fato. Quando a pessoa começa a se relacionar com o social, sempre estará exporto aos conflitos da realidade logo no primeiro contato com o mundo.
            O coração carrega a iminência da essência, ou seja, constitui a própria natureza da realidade. “Não importa a distância que nos separa, mas sim o amor que nos une”. Essa frase serve de consolo para afagar os redemoinhos de lembranças encarcerados na mente, é uma maneira do viver, uma busca da existência feliz, uma forma de encarar a real circunstância. Cai como uma “luva” para suportar a saudade dos corações amanteigados. Dentro do circulo interpretativo dos sentimentos e as perspectivas do ser nas estruturas que dão sustentação ao processo com o mundo interior, chega-se a uma conclusão do tamanho da complexidade sensitivo das pessoas (é claro que nem todos pensam e agem da mesma forma e nem devia, os momentos são íntimos). Mas uma coisa é certa, viver é muito simples. Ser feliz é mais simples ainda. Viver e ser feliz são inexplicáveis. É a própria vida. O conceito de emoção é universal, no entanto, as expansões culturais das experiências é o diferencial das variações que reage nas pessoas às questões impostas pela a ambientação do instante.
            O tema em questão é assunto recorrente entre alguns especialistas que buscam entender “à luz da consciência dos sentimentos obscuros e recalcados” do ser humano. É impossível entender os afetos enigmáticos das matrizes psíquicas. “as emoções são expressões afetivas acompanhadas de reações intensas...” Com os pensamentos focados em estimo apreço e com toda a sentimentalidade envolvente da pessoa amada, tudo faz lembrar o caminho percorrido do até então. As reações comportamentais, a maneira expressiva, os movimentos exploratórios, a respiração ofegante, a aceleração cardíaca... Todas as manifestações presentes na vida remetem as lembranças da pessoa por quem o coração pulsa. Quando a ação é intensa e verdadeira a efervescência constitui o alimento da alma, seja qual forem às flutuações das reações enérgicas, o conflito dos sentimentos estará sempre vivo.     
            A emoção é automática e inconsciente. Variam na intensidade de pessoa para pessoa e pode ser negativa ou positiva. Todas as formas são usadas para sanar as sensibilidades aprisionadas ao peito quando no instante vazio. Seja olhar as fotografias dos momentos felizes, refazer o percurso do caminho o qual andaram juntos... Tudo vale para avivar os pensamentos na figura da pessoa por quem o fogo queima.
        
(*) JOSSELMO BATISTA NERES
E-mail: josselmo@hotmail.com
 

Crônica publicada no Jornal Diário do Povo do Piauí em 04/10/2014 na página 02 - Opinião (Jornal Impresso).
Pode também ser conferido na íntegra na Edição Eletrônica no endereço abaixo:
http://www.diariodopovo-pi.com.br/Jornal/Default.aspx