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segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Dezembro atemporal

        Começo esta crônica com o bico da pena tecendo palavras sem conexão com os padrões da contextualização. Todavia, no labor que emana o ofício, pregando uma palavra aqui outra ali, logo o cérebro que estava adormecido ressurge com plena fluidez. Os vocábulos se reorganizam, os termos são esculpidos e as palavras ganham cor, som e imagem. No início da lida, com as frases ainda em descompasso, um punhado de letras ficou martelando e em meio a outras palavras uma permaneceu querendo sobrepor sobre as demais. Dezembro. Isso mesmo. Deu pra entender? O décimo segundo e o último mês do ano no calendário gregoriano. Não? Também não entendi a tamanha persistência. No entanto, no final do escrito, talvez, venha à compreensão do por quê. O leque estar aberto. Porém, vou logo adiantar, os acontecidos não se referem exclusivamente ao mês que sucede novembro. O período o qual se evoca é um dezembro atemporal. Assim como os demais do ciclo, em nenhum dos fatos, o período é afetado pelo passar do tempo. Pertence ao presente. É imutável.
           Os anos, os meses e os dias são meras convenções usadas para descrever o tempo, para situar o vivente no espaço e orienta-lo na contagem da caminhada. Os dias são todos iguais. O calendário é um tratado. Entretanto, nós envelhecemos com os efeitos da pulsação. Todo o emaranhado de palavras que a pena dispôs a enveredar fala do hoje que amanhã será o ontem, e que, o que muda em relação um ao outro dia, são as ações construídas na passagem de cada o agora. Os pensamentos que nasceram no princípio do diálogo sobre o mês de dezembro, os quais imprimidos nesse enredo remetem ao seguinte: em acordo, é a fase repleta de confraternizações em meios às empresas, funcionários e colaboradores. O tempo de celebrar as metas e as conquistas alcançadas no decorrer dos doze meses. A bola gira. Em meio às congratulações o autor da festança parabeniza os feitos assim como, um tanto quanto, já começa a maquinar os números a serem galgados no ano vindouro. O investimento nas reuniões ruidosas vale a pena. Afinal de contas, funcionário satisfeito e sinal de maiores resultados. Almoço de graça é mera ilusão.
          Na contextura notável observa-se que não só o último, mas alguns outros meses dentro do ciclo dos 365 dias são contemplados com período do regozijo. A etapa que abrange as festas em cada época do ano preconiza a caminhada em nossa volta. As datas festivas no sistema de divisão do tempo é invenção humana. Alguns meses celebram isso ou aquilo e quem ganha é a economia com o aquecimento das vendas no comércio. A entrada é pela confraternização universal. Dentre outros segue, carnaval, semana santa... Dia de natal. Vou findar por aqui. O bom velhinho de barba branca e roupa vermelha vindo do polo norte bateu à porta. Ver-nos-emos em outra história.

(*) JOSSELMO BATISTA NERES
E-mail: josselmo@hotmail.com
 Crônica publicada no Jornal Diário do Povo do Piauí em 21/12/2014 na página 02 - Opinião (Jornal Impresso).
Pode também ser conferido na íntegra na Edição Eletrônica no endereço abaixo:

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Tempo presente

      Caminhando na pista de cooper a ermo, no compasso ouço música com o fone de ouvido e observo a via com o vai e vem dos pedestres e ciclistas. No momente do dinamismo de oxigenação do cérebro, os pensamentos em um impulso natural, de repente fazem um redemoinho na cachola pela busca da significação de como é feito a construção do tempo dentro da ocasião oportuna. O termo é instigante. No instante quase que instintivamente ergo o braço para ver as horas no relógio analógico e vejo os ponteiros em plena labuta. Vendo o tic tac da rotação do tempo, pensei: Como é valioso cada segundo, só quem sabe o valor é quem já deixou de viver algo por falta de uma fração. Um exemplo claro é um piloto de Formula 1, que perde o campeonato por um milésimo de segundo. No entanto, seguindo no ritmo em meio aos praticantes da atividade física e vendo toda a aglomeração espalhada pela avenida, o assunto pertinente floresce nos subsequentes vocábulos: O valor do Tempo. A construção do presente. A vivência do agora. O tema aguçou-me a curiosidade na retidão do alegorismo das palavras. As ideias afloraram. Peguei o celular no bolso do short, e mesmo em movimento cliquei na funcionalidade de mensagens e escrevi algumas palavras que veio de forma espontânea sobre o tópico concernente e as salvei. Chegando em casa e dirigindo-se a escrivaninha, as expressões se juntaram a outros e se complementaram, os quais, caro leitor, são estes espelhados pelo corpo dessa crônica.  
O tempo é o intervalo calculado pela imagem representativa da visão. O momento em pulsação. A fase em andamento. A duração dos fatos. O período. O hoje. O agora. Para nos situar no espaço dos acontecimentos vamos buscar as seguintes acepções dos termos “tempo” e “presente” para compreendermos as circunstâncias infindáveis das fases do tempo. Nos emaranhados de significados emblemáticos, roubei o parecer que segue por parecer meu: “Presente é um termo para designar o tempo do agora, que não é nem passado nem futuro. Como o tempo é algo que flui constantemente sem pausas, é impossível marcar o presente já que a cada intervalo de tempo que passa o presente vira passado, assim, o presente é constante e infinito”.
O poeta Cazuza em alusão a sucessão dos momentos, em um trecho da letra da música “O Tempo Não Pára” trovou: “Tuas ideias não correspondem aos fatos / O tempo não para / Eu vejo o futuro repetir o passado / Eu vejo um museu de grandes novidades / O tempo não para / Não para, não, não pára”. Isso é uma verdade. O tempo não pará, nós é que paramos no tempo. Basta olhar os ponteiros na rotação do sentido horário para ver que a duração de cada parte do compasso é fugaz, evapora-se em segundos e nos deixa atônito no espaço. O tempo é a vivência dentro de um período em sua extensão. O tempo é indefinível. Todavia, não tão claramente, a duração limitada intercorre no transcurso de cada período, de cada fase e de cada instante da vida. A sucessão dos momentos é subjetiva. Certeza é olhar para o relógio e saber que a cada segundo que ocorre é um segundo a menos na nossa existência. “O hoje é uma dádiva, o amanhã é um mistério”. Viva o agora.
           
(*) JOSSELMO BATISTA NERES
E-mail: josselmo@hotmail.com

Crônica publicada no Jornal Diário do Povo do Piauí em 09/12/2014 na página 02 - Opinião (Jornal Impresso).
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terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Escrevo. E pronto


Romance, conto, crônica, poesia... Enfim, não importa o gênero, a temática, o estilo. Todas as palavras agasalhadas nos vocábulos trazem nas entrelinhas o poder evolvente do marco da existência, trazem o que o literato deveras vive. Será? Não tenho procuração para tal. Escritores. Quem sabe lá o que se passa nas brilhantes cacholas. O que posso afirmar é que falar sobre você mesmo é uma tarefa cansativa e enfadonha. Muito difícil. Entretanto, no labor, não como um tanto quanto Paulo Leminski, “Escrevo. E pronto. / Escrevo porque preciso / preciso porque estou tonto. / Ninguém tem nada com isso. / Escrevo porque amanhece. / E as estrelas lá no céu / Lembram letras no papel, / Quando o poema me anoitece. / A aranha tece teias. / O peixe beija e morde o que vê. / Eu escrevo apenas. / Tem que ter por quê?” Falo por mim. Alguma indagação? Enquanto não sou inquirido, dirijo-me a você, a você mesmo caro leitor, que estar em silêncio a balbuciar esses amontoados de palavras, vos digo, estás a discorrer sobre o encanto do feitiço em que se encontra o redator. Sem objetivar a importância que o público vá considerar, nem a atenção que os críticos vão lançar. Nada importa o que pensam do escrito. As palavras imperativas (por vezes e em muitas e muitas vezes) são usadas para preencher a necessidade imposta pela alma da própria alma. Pelo menos assim eu acredito que as asas vos envolvem. Leminski no poema “Razão de ser” expressa o sentimento de o ato escrever com maestria.
Em “Cartas a um Jovem Poeta”, Rilke fala ao aprendiz do ofício, o árduo jogo de misturar letras em palavras, às quais, “ninguém o pode aconselhar ou ajudar, - ninguém. Só existe um caminho: penetre em si mesmo e procure a necessidade que o faz escrever. Observe se esta necessidade tem raízes nas profundezas do seu coração e de sua alma. Confesse a si mesmo: morreria, se lhe fosse vedado a escrever? Isto acima de tudo: Pergunte a si mesmo na hora mais tranquila de sua noite: ‘Sou mesmo forçado a escrever?’ Escave dentro de si uma resposta profunda. Se for afirmativa, se puder contestar àquela pergunta severa por um forte e simples ‘sou’, então construa a sua vida de acordo com esta necessidade”. Bonito de se ler, lindo de se ouvir. Perfeitas palavras. Aplausos para o poeta alemão que lança aos amantes da arte a beleza refulgente, e os fazem enxergar de outra forma a premência que está dentro de si incomodando, e que chega a ser como uma gravidez, que, enquanto os vocábulos não nascem o corpo fica se retorcendo. Alguém ai mim entente?
As palavras nascem no despertar da necessidade da alma. Juntar letras e esculpir um texto seguindo uma sequência logica é uma tarefa que exige dedicação e coordenação para o pleito. É uma lida espinhosa que o autor chega a sofre antes, durante e depois. O coração fica saltitando pela necessidade que existe de ser posto ao mundo e que até então estar preso ao peito e quase já explodindo para serem lançadas a eternidade. As palavras fluem pela pura e simples conveniência da alma. Embaralhar letras, formar frases, imprimir o reflexo dos pensamentos... Dar som e imagens. É expor os sentimentos que nos move. Não importa a forma nem a estrutura, o compositor usa as palavras como uma terapia, para expor as agruras, o que às vezes, tende a usar a “ficção de mentiras” para contar o real e, no entanto, marcar o seu lugar na existência. Chega, não vou ater em pontificar. Não tem um por quê. Escrevo. E pronto.  

(*) JOSSELMO BATISTA NERES
E-mail: josselmo@hotmail.com
 

Crônica publicada no Jornal Diário do Povo do Piauí em O2/12/2014 na página 02 - Opinião (Jornal Impresso).


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quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Água de chuva


        Domingo amanheceu com um calor escaldante. Na sombra o termômetro marcava quarenta graus. Essa temperatura não foi registrada apenas no domingo, mas durante uma boa parte do ano. A esperança é que chegou o mês de novembro e no nordeste brasileiro é a época em que dar sinal o característico inverno. A expectativa do nordestino renasce quando começa cair os primeiros pingos de chuva no solo esturricado. “O barreiro esta na lama e a roça está limpa, quase não tem mais água nem pastos para os animais” Lamenta o sertanejo. Devido os efeitos da estiagem os animais emagrecem e o criador não consegue desfazer do rebanho e quando consegue vender é a preço de “banana” por estar tão magro. Mas não tem outra saída. “Não é de ver os bichinhos morrer”. Reclama o fazendeiro.  
Para alegria dos viventes do torrão a chuva apontou na segunda-feira. Ninguém viu a cor do sol nesse dia. São Pedro começou abrir as torneiras na antemanhã e se prolongou por quase o dia inteiro. Ora as gotas caiam com intensidade, ora afinava. Fazia tempo que não era visto uma chuva com tantos milímetros em um único dia. Para quem estava diuturno acostumando com um calor insuportável, o clima ficou agradabilíssimo. Uma verdadeira festa não só para os criadores que labutam diariamente procurando a sobrevivência dos animais e nem para os agricultores que necessitam da terra molhada para colocar em prática a arte do ofício, mas para todos que vivem nas agruras esperando os pingos de água tombar do firmamento para amenizar o sofrimento causado pelas consequências do verão.
As dez da matina um cidadão magro de “cabelos e bigode de intensa alvura”, chapéu de massa, calca brim, camisa de manga curta e sapatos de couro, estava sentado em um estabelecimento fitando a chuva serena banhar as pessoas e os carros que trafegavam na via movimentada de Picos. Um senhor de porte ereto, cabelos grisalhos, calca jeans, camiseta (estilo polo) e de botas de vaqueiro se aproximou: “Bom dia compadre Conrado, choveu lá em Sussuapara?” Prontamente o ancião retrucou: “Bom dia Anastácio, choveu sim e foi água compadre, a chuva começou às três da manhã, vim aqui na cidade resolver uns problemas, mas quando sair de lá oito horas ficou chovendo”. Conrado interpelou: “Eu encontrei com o Chico de Gabriel e ele disse que já veio hoje do Ipiranga e lá ficou chovendo.” Anastácio indagou: “Parece que é geral, estava precisando mesmo compadre que a seca estava grande, quem mais sofre são os animais”.           
Após despedirem-se com um gesto de aperto de mãos, Anastácio se distanciou e Conrado continuou contemplando a paisagem proporcionada pela beleza das águas pluviais. Quando as primeiras águas caem no torrão, à pluviosidade limpa a poeira das estradas, lava a calha dos telhados, nascem às primeiras ramas, aviva o canto dos pássaros, fortalece o berro do rebanho, altera a sensação térmica... Dar vida a alma do ser. A água de chuva é uma dádiva que desaba do céu para germinar a vida no solo endurecido, e tão logo pousa na terra as árvores retorcidas, cinzentas e secas que pareciam estar mortas, começam a vigorar e o verde se espalha pela vegetação da caatinga. Inicia-se um novo ciclo.      


                         (*) JOSSELMO BATISTA NERES
E-mail: josselmo@hotmail.com

Crônica publicada no Jornal Diário do Povo do Piauí em 25/11/2014 na página 02 - Opinião (Jornal Impresso).

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domingo, 16 de novembro de 2014

As cores de Oeiras

             Heitor mora em Picos e no final de semana dirigiu-se a Oeiras para visitar Letícia, sua filha de oito anos que reside na cidade. Já faziam trinta e quatro dias que não se viam. A saudade entre os dois estava transbordando, no entanto, quase todos os dias se falavam por telefone. Heitor e Letícia combinaram o encontro no sábado para amenizar a saudades. Aterrissando na Primeira Capital, Heitor teve como cartão de visitas um forte abraço e um formidável beijo da filha. Após a cena aconchegante seguiram para o centro da cidade em excursão. O meio-dia apontou e a escolha do local para o almoço fica a cargo da filha, que prontamente elege o restaurante desejado. Os dois permanecem no lugar por uma hora e antes, durante e depois da refeição conversam harmoniosamente. 
Saciados, chega o momento de evadirem-se da casa de pasto. Seguem rumo à casa de uns parentes que habitam na cidade. O dia estava com um sol a pino. Passados alguns minutos com os familiares, a filha chama o pai para continuar a peregrinação pela cidade. A praça situada em frente à Igreja Catedral de Nossa Senhora da Vitória foi o ponto escolhido para dar inicio a jornada vespertino. Ficaram sentados por uns instantes na sombra de uma castanhola, e entre uma conversa e outra os olhos fitavam as paisagens e aproveitando o cenário em volta começaram a tirar fotografias, usando como pano de fundo a Catedral, o Museu de Arte Sacra, o Cine Teatro Oeiras, este tem a grafia do ano 1940 lavrado na fachada... Prédios do Centro Histórico e Cultural da cidade. Quase em frente onde estavam na Praça das Vitórias, o prédio da Prefeitura Municipal que outrora abrigou o Círculo Operário, antiga casa de Câmara e Cadeia da Província do Piauí, fazia parte do adorno.
Induzida pelo calor escaldante, a sede aguçou, então foram ao “Bar Dois Irmãos” (um estabelecimento que fica na frente do Museu), procurar água para refrescar a garganta. Compraram duas garrafas de água mineral e saíram em direção ao Passeio Leônidas Melo/Praça da Bandeira onde agrega os edifícios do Cine Teatro, Associação Comercial e o Café Oeiras. Beberam a água e ficaram por alguns minutos num banco em baixo de uma sombra refrigerada. Admirando o panorama ao entorno, Heitor comenta com Letícia sobre a casa ao lado da Praça das Vitórias (o Espaço Cultural Solar das Doze Janelas), a filha retruca: “é a Casa das Doze Janelas papai, eu fui lá no dia que teve um passeio do colégio”. A filha vendo o interesse do pai pelo assunto pertinente continuou: “eu também fui naquela casa, o dono dela tinha escravos”, apontando para uma casa que fica na mesma fileira do belíssimo prédio da Prefeitura. Como em Hollywood o nome “OEIRAS” estar grafado no alto do Morro da Cruz, e Heitor ao mostrar para Letícia o ponto turístico (visto da praça) localizado há alguns quilômetros, a curiosidade da filha foi despertada e lá foram os dois ao encontro de novas descobertas.
No caminho de volta ao avistar o Morro do Leme: “papai vamos lá na santa”, demandou a filha. O pai estava cansado das andanças mais não relutou. Prosseguiram em direção ao morro que tem bem no alto a estátua de Nossa Senhora da Vitória, padroeira do Piauí e da cidade. Após chegar e dar uma vista em volta, começaram a galgar os degraus até se ater aos pés da Santa. Assim como no Morro da Cruz, a vista da cidade do alto do Leme é privilegiada. Parabéns aos dois pela caminhada nas “cores de Oeiras”. Na próxima ida a Capital da Fé, aconselho continuarem a visitação pelo Patrimônio Cultural, e se eu for autorizado, como neste, o passeio ganhará vida.      

                         (*) JOSSELMO BATISTA NERES
E-mail: josselmo@hotmail.com

Crônica publicada no Jornal Diário do Povo do Piauí em 15/11/2014 na página 02 - Opinião (Jornal Impresso).
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quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Paraíso perdido

          Os riachos, a lagoa, os poços de água quente, a forma exuberante dos morros, a cultura regional e tudo o mais posto no seio do lugar são patrimônios cravados no coração do fidalgo. Perdido no meio do sertão piauiense, Banco de Área, outrora um povoado, transformou-se na cidade de São Miguel do Fidalgo. O bucolismo remoto espalhados em cada canto do imenso território transmutou-se com a agitação guiada pelo impulso do desenvolvimento. A calmaria do éden situado à beira da lagoa de águas cristalinas permutou com a euforia dos roncos dos motores. O progresso chegou e a magia de até então, foi levado pelas manobras das benfeitorias emplacadas pelo processo da evolução espontânea. A simplicidade campestre transformou-se na modernidade dos centros.
As estradas estreitas de terras com barrancos de área de um lado e de outro do percurso em alguns trechos, dificultava o tráfego, e juntamente com as poças de lama causavam muitos atoleiros nos veículos. Nada que ofuscasse o brio do paraíso. As trilhas eram uma grande aventura para os visitantes, e que os levavam, ao portento das belezas plantadas no coração do sertão. Logo as estradas vicinais deu lugar às vias asfálticas e encurtou os caminhos e apressou o movimento do vai e vem dos automóveis. Linda um tanto quanto, dentre aos patrimônios, a Lagoa do Fidalgo é um oceano de águas azuis, “um mar no meio do sertão, / espelho do céu em noites estreladas”, balneário de ponta a ponta, um verdadeiro monumento da natureza. O paraíso continua ileso, no entanto, o aceleramento da progressão, tornou-se a vida mansa em que levava o sertanejo no campo mais frenético. A paciência do pescador que passava horas e horas parado no meio da lagoa, dentro de uma canoa e em completo silêncio com a vara de pescar na mão esperando o peixe beliscar a isca e o caçador que saia com a capanga cheia de pedras (já catadas antes, para servir de munição) e com a baladeira na mão adentrando mata adentro e pisando macio para não espantar as presas, essas virtudes quase já não existem.  
Casebres de chão batido, água barrenta nos potes, panelas em trempe, noites escuras clareadas com velas a querosene, labuta com os animais (gado, ovelhas, cavalo, jumento...) e a lavoura na roça... Um tudo o quanto no que é visto no panorama da vida interiorana, evoluiu-se para tudo que há de mais moderno, e o moderno com o passar foi se modernizando. Essa é a lei. O paraíso perdido do fidalgo arraigado no bucolismo do meio do sertão aos poucos foi progredindo pelas vias do sistema natural. A metamorfose almejada no inconsciente do sertanejo faz jus ao ditado que diz: “cuidado com o que você deseja, o seu desejo pode-se realizar”. O novo manou para o bem de todos. Nada tira o brilho do encanto, no encanto de toda a beleza espalhada pela imensidão do torrão. 
A venustidade cravada na terra castigada pela seca é uma providência de Deus. O sossego transmitido pela paisagem em meio ao enraizamento do complexo turística inspira a paz e a tranquilidade. O paraíso perdido aos poucos foi sendo revelado, todavia, não tanto como ele é, mas tudo como antes, continua intacto na memoria do “menino que ainda existe”. Conheça o vale do fidalgo.

                         (*) JOSSELMO BATISTA NERES é funcionário do Banco do Brasil
E-mail: josselmo@hotmail.com
 Crônica publicada no Jornal Diário do Povo do Piauí em 09/11/2014 na página 02 - Opinião (Jornal Impresso).

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