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terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Escrevo. E pronto


Romance, conto, crônica, poesia... Enfim, não importa o gênero, a temática, o estilo. Todas as palavras agasalhadas nos vocábulos trazem nas entrelinhas o poder evolvente do marco da existência, trazem o que o literato deveras vive. Será? Não tenho procuração para tal. Escritores. Quem sabe lá o que se passa nas brilhantes cacholas. O que posso afirmar é que falar sobre você mesmo é uma tarefa cansativa e enfadonha. Muito difícil. Entretanto, no labor, não como um tanto quanto Paulo Leminski, “Escrevo. E pronto. / Escrevo porque preciso / preciso porque estou tonto. / Ninguém tem nada com isso. / Escrevo porque amanhece. / E as estrelas lá no céu / Lembram letras no papel, / Quando o poema me anoitece. / A aranha tece teias. / O peixe beija e morde o que vê. / Eu escrevo apenas. / Tem que ter por quê?” Falo por mim. Alguma indagação? Enquanto não sou inquirido, dirijo-me a você, a você mesmo caro leitor, que estar em silêncio a balbuciar esses amontoados de palavras, vos digo, estás a discorrer sobre o encanto do feitiço em que se encontra o redator. Sem objetivar a importância que o público vá considerar, nem a atenção que os críticos vão lançar. Nada importa o que pensam do escrito. As palavras imperativas (por vezes e em muitas e muitas vezes) são usadas para preencher a necessidade imposta pela alma da própria alma. Pelo menos assim eu acredito que as asas vos envolvem. Leminski no poema “Razão de ser” expressa o sentimento de o ato escrever com maestria.
Em “Cartas a um Jovem Poeta”, Rilke fala ao aprendiz do ofício, o árduo jogo de misturar letras em palavras, às quais, “ninguém o pode aconselhar ou ajudar, - ninguém. Só existe um caminho: penetre em si mesmo e procure a necessidade que o faz escrever. Observe se esta necessidade tem raízes nas profundezas do seu coração e de sua alma. Confesse a si mesmo: morreria, se lhe fosse vedado a escrever? Isto acima de tudo: Pergunte a si mesmo na hora mais tranquila de sua noite: ‘Sou mesmo forçado a escrever?’ Escave dentro de si uma resposta profunda. Se for afirmativa, se puder contestar àquela pergunta severa por um forte e simples ‘sou’, então construa a sua vida de acordo com esta necessidade”. Bonito de se ler, lindo de se ouvir. Perfeitas palavras. Aplausos para o poeta alemão que lança aos amantes da arte a beleza refulgente, e os fazem enxergar de outra forma a premência que está dentro de si incomodando, e que chega a ser como uma gravidez, que, enquanto os vocábulos não nascem o corpo fica se retorcendo. Alguém ai mim entente?
As palavras nascem no despertar da necessidade da alma. Juntar letras e esculpir um texto seguindo uma sequência logica é uma tarefa que exige dedicação e coordenação para o pleito. É uma lida espinhosa que o autor chega a sofre antes, durante e depois. O coração fica saltitando pela necessidade que existe de ser posto ao mundo e que até então estar preso ao peito e quase já explodindo para serem lançadas a eternidade. As palavras fluem pela pura e simples conveniência da alma. Embaralhar letras, formar frases, imprimir o reflexo dos pensamentos... Dar som e imagens. É expor os sentimentos que nos move. Não importa a forma nem a estrutura, o compositor usa as palavras como uma terapia, para expor as agruras, o que às vezes, tende a usar a “ficção de mentiras” para contar o real e, no entanto, marcar o seu lugar na existência. Chega, não vou ater em pontificar. Não tem um por quê. Escrevo. E pronto.  

(*) JOSSELMO BATISTA NERES
E-mail: josselmo@hotmail.com
 

Crônica publicada no Jornal Diário do Povo do Piauí em O2/12/2014 na página 02 - Opinião (Jornal Impresso).


Pode também ser conferido na íntegra na Edição Eletrônica no endereço abaixo:

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